Geneviève Faé, professora de redação e escritora
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10.09.2021 - 16h01min
"Uma coisa ficou clara: 95% da população é ignorante." Opa. Já espichei o ouvido na conversa alheia, na mesa ao lado, ainda mais porque vinha recheada de porcentagem. Tenho gostos peculiares... um prazer estranho, levemente invasivo, que é gostar de ouvir as conversas dos outros nos cafés. Simplesmente não consigo controlar.
Já ouvi reuniões de trabalho, desabafos de amigas, roda de conversa de aposentados, semiconflitos de casais, propostas de emprego, ouvi de tudo. "Tu acha que alguém lê no Nordeste?" Eu fui ouvindo e refletindo sobre uma porção de falácias no discurso de um deles, em especial. Outro discordava só na movimentação do olhar, todavia não ousava verbalizar.
"O Nordeste decide as votações. Estamos perdidos." Os rótulos que colamos nas pessoas, nos povos, nas culturas, nos outros. Sempre nos outros, nunca em mim. Eu não me reconheço nas categorias. Etiquetados, os indivíduos perdem o escopo de ação. Já são julgados de antemão. Já são categorizados, todos "farinha do mesmo saco" (geralmente furado). Sim, digo "nós", você e eu inclusos nessa mania. A diferença é o tipo de rótulo que usamos, mas classificamos tudo em categorias, pois isso facilita o processo de pensamento.
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No entanto, é uma armadilha e quem cai é o raciocínio. Lembro de ter lido sobre o viés do endogrupo e exogrupo. Em "A arte de pensar claramente", Rolf Dobelli explica que temos uma ilusão de homogeneidade ao olhar para um grupo do qual não pertencemos. É daí que surgem estereótipos e preconceitos, distorcendo a visão da realidade. E tendemos a concordar (meio cegamente) com as ideias do "nosso grupo", gerando sensação de pertencimento. Como somos seres gregários e evoluímos em grupo, em grupo queremos permanecer. Essa categorização, em suma, é uma forma de pensar e organizar o "mundo". Só que é uma forma rasa, questionável, superficial, preconceituosa.
Falácias que aprendemos direta ou indiretamente, via discurso familiar, midiático, escolar, político, religioso... Penso que uma das funções da educação do cidadão do século XXI deve ser educar para não categorizar. Educar para repensar, para descolar o rótulo do outro. Educar para rasgar o rótulo. Seres humanos são muito complexos para serem reduzidos em categorias. Educar o aluno (e o filho) para ler o mundo. Para ajustar as lentes antes de olhar. Para ler nas entrelinhas.
E eu fazia o que no café?! Não estava em grupo. Sozinha, eu lia. Lia e ouvia (juro que consigo). De pronto me dei conta que o livro em mãos era uma obra feminista. Meu Deus do céu, dei um jeito de esconder rapidamente a capa, afinal "feminista é tudo mal-amada".
Geneviève Faé
Professora de redação e escritora
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