Geneviève Faé, mestre em Letras, Cultura e Regionalidade, professora de redação e escritora
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20.10.2021 - 09h51min
"Pense positivo." "Poderia ser pior." "Seja mais otimista." "Encare a vida com mais leveza." Aos poucos, a positividade vai inundando a vida de forma tóxica: não é mais permitido estar infeliz, em estado reflexivo. Se o escritor e médico Rubem Alves estiver certo, ostra feliz não produz pérola. Então, os estados de inquietação não seriam cruciais para nos transpor a outras realidades, mais valiosas, tal como uma pérola?
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O advento das redes sociais nos conectou de tal modo que é possível acompanhar o cotidiano de qualquer pessoa no mundo globalizado. Embalados pelo "good vibes only", vemos (e somos vistos). Os momentos de bem-estar e alegria, mesmo em meio a uma pandemia, tomam conta de 99% de nossas redes. Todos parecem bem. Todos estão bem. Estão?
A Psicologia nomeia como "positividade tóxica" essa pressão exterior ao indivíduo para que ele esteja 100% do tempo bem, ou ao menos pareça bem, na sua vida virtual. Assim, a foto da conquista aparece no feed, mas as horas de insônia, os esforços diários, as dúvidas pelo caminho, nada disso é publicável. Nada captável pelos nossos cliques frenéticos. E sempre fica aquela impressão de que a vida dos outros é mais fácil, mais rica de experiências.
Não estou dizendo para cantarmos nossas derrotas no meio virtual: cada um posta o que deseja, porém precisamos pensar no impacto. Publicações motivacionais ajudam? Nem sempre. Por vezes, é preciso se recolher e silenciar, mesmo quando nos dizem para seguir a vida. Penso que nossos tempos líquidos nos fazem vivenciar muito rapidamente os altos e baixos. Nos altos, conte a todo mundo o que está acontecendo agora. Enquanto acontece. Nos baixos? Vai passar. Vista um sorriso e vá. Parece que não mais fruímos nossos estados interiores, portanto, pouco aprendemos com eles.
É impossível não lembrar do "Poema em linha reta", de Álvaro de Campos (heterônimo de Fernando Pessoa): "Nunca conheci quem tivesse levado porrada. Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo". Voltando ao início, o "pense positivo" precisa ser dito com precaução, sob pena de soar falta de empatia, até porque o otimismo ingênuo não nos prepara para os diversos cenários que a vida nos reserva. Ele projeta um, apenas o melhor. E a vida e o acaso nos pegam de surpresa, algo que 2020 não cansa de mostrar. Talvez um meio-termo, no sentido aristotélico, seja uma saída: encarar a vida com leveza e com coragem, porque o peso da existência recai de forma mais dura a quem não souber abraçá-lo.
Geneviève Faé,
Mestre em Letras, Cultura e Regionalidade, professora de redação e escritora.
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